Home SinjorBA LOCKDOWN EM A TARDE – Sem salário, sem jornal: Equipes do impresso baiano fazem paralisação nos dias 24 e 25 de fevereiro

LOCKDOWN EM A TARDE – Sem salário, sem jornal: Equipes do impresso baiano fazem paralisação nos dias 24 e 25 de fevereiro

por Fernanda Gama

Em plena crise sanitária que está mobilizando o mundo, com números caminhando, somente no Brasil, para contagem de 250 mil mortos por conta da Covid-19, outras realidades são somadas ao fardo de alguns: os profissionais de imprensa de Massa e A Tarde, mais antigo jornal – ainda e por bem pouco – em circulação na Bahia estão com salários atrasados por, pelo menos, três meses. A situação de desalinhos financeiros, que constrange os trabalhadores, se arrasta desde 2012 e, com o tempo, vem se acentuando. 

Uma paralisação de 48 horas, marcada para dias 24 e 25 de fevereiro e decidida, no dia 19, em assembleia virtual, foi a saída para chamar atenção ao que vem acontecendo. “Se sabe que a pandemia foi complicada para a maioria, mas foi benéfica para muitos jornais. A Tarde publicou que cresceu em 5% a vendagem no ano passado, em dezembro, mas viramos o ano faltando três salários. Pagaram o de outubro agora, neste ano, no mês de janeiro. Já novembro, até agora, não foi pago”, conta um dos funcionários. “A gente chegou numa situação em que a empresa também não quer dialogar, não quer negociar, não quer conversar com a gente. Nossa saída, agora, é tentar uma paralisação. Tínhamos um prazo até a último dia 13 de fevereiro para quitar todos esses salários em atraso, mas não foi cumprido”. Além de salários, também estão atrasados pagamentos de valores de férias, FGTS e auxílio refeição. “Continuam descontando de nosso salário, mas tem uns 17 ou 18 tíquetes que eles estão nos devendo. O valor é de R$ 288 por mês”, completa. Na lista de dívidas do Grupo A Tarde, há a ausência de pagamento de 13º salários desde 2016.

Histórico (ou como minar a autoestima dos profissionais)

Uma demissão em massa, há cerca de nove anos, foi o gatilho para o roteiro deprimente que o então maior impresso no Nordeste vinha ganhando. A sagacidade de seu fundador, Ernesto Simões Filhos, no início do século XX, não foi legada aos que, décadas depois, assumiriam a direção do centenário veículo. “As pessoas receberam as rescisões parceladas em até oito vezes. Aí começaram os problemas. Começaram a atrasar salários por alguns dias, depois foram retiradas as quinzenas [de pagamentos salariais]. Foi piorando, piorando. Eles começaram a fazer mais demissões sem pagar; colegas, sem receber nada, tinham que entrar na justiça. Houve bloqueio nas contas do jornal por causa dessas ações trabalhistas e eles entraram em acordo com Tribunal Regional do Trabalho, com compromisso de pagar determinada quantia por mês”, lembra outro profissional do veículo. Os montantes a serem pagos, sejam de salários, sejam de rescisões, foram divididos em três grupos: um com pessoas que tinham até R$ 50 mil para receber, outro com os de R$ 100 mil e o último com aqueles que tinham R$ 150 mil ou mais. Entretanto, os acordos não foram cumpridos como esperado e as dívidas se arrastam.

O atraso no pagamento de salários não é mero assunto da gestão do Grupo A Tarde com seus funcionários, sejam eles contratados sob regime de CLT ou por CNPJ. Cada profissional que deixa de receber o dinheiro referente a seu trabalho é um cidadão que não poderá cumprir com suas obrigações financeiras e terá afetada sua gestão de vida pessoal, como pagamento de aluguel e contas de água ou mesmo ir ao supermercado comprar alimentos. “Tem gente que passou constrangimento por conta de plano de saúde atrasado. Você chega ao médico, mas mandam você procurar o RH de sua empresa. Aí você precisa ser atendido pelo particular. Paga por fora, mas nunca é reembolsado por isso. Só que o jornal [A Tarde] desconta do nosso salário o valor do plano. Isso se torna, também, uma apropriação indébita”, reclama um terceiro empregado do grupo. Com a determinação de cumprimento de jornada de trabalho em home office, por conta da pandemia, o profissional precisa ter, em dia, contas de luz e internet para garantir, dentro da própria casa, o ambiente que não está sendo proporcionado pelo empregador. “Isso é triste, porque, quando você se sujeita a situação assim, as pessoas começam a perder um pouco de credibilidade em você. Entre viver dessa forma, com essa situação de atraso, e o jornal fechar as portas e pagar todo mundo, é melhor que o jornal feche as portas e arque com seus compromissos”, finaliza.

Diante do cenário humilhante em que a empresa está colocando os funcionários, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado da Bahia comunicou à diretoria do Grupo A Tarde, na última sexta-feira, que os jornalistas dos veículos A Tarde e Massa decidiram paralisar suas atividades por dois dias, quarta (24) e quinta-feira (25), devido aos atrasos de pagamento dos salários de novembro e dezembro de 2020, janeiro de 2021 e férias de fevereiro de 2021.